(FOTO: DIVULGAÇÃO)
Ahistória da cartunista Laerte Coutinho é uma das mais novas apostas da Netflix. No primeiro documentário brasileiro produzido pela empresa, Laerte-se, as diretorasLygia Barbosa e Eliane Brum revelam de forma sensível e esclarecedora as transformações que fizeram com que "o" Laerte se transformasse em "a" Laerte.
O cuidado com a questão da transsexualidade é notável e o resultado é uma obra elucidativa, que informa como a questão de gênero pode ser muito mais ampla do que o pensamento binário restrito ao "masculino" e "feminino".
No entanto, o esforço da Netflix deixou algumas arestas que mostram como o uso da língua pode ser confuso nestes casos. Ao clicar na opção de áudio descrição em português — um recurso inclusivo para pessoas com defiêncie visual — a narradora se refere à cartunista no masculino, quando a própria artista reforça durante o filme a questão dos pronomes de tratamento.
"No meu caso, talvez exista uma imprecisão, por causa dos 40 anos que passei sendo conhecida publicamente como um cartunista, assim no masculino", explicou Laerte à GALILEU. "Por conta disso, costumo ser meio flexível, o que não significa que não ligue."
Desde 2010, a artista luta para ser tratada no feminino, mas ainda enfrenta certa resistência — como grande parte da população trans. A questão é importante porque é peça fundamental no reconhecimento de identidade por quem passa pela transformação.
Como afirmou Carmen Rosa Caldas-Coulthard, pós-doutora em língua inglesa pela University of Strathclyde, em reportagem da revista Vice, a linguagem não é apenas um luxo intelectual, mas uma parte essencial na luta pela libertação das minorias.
"As feministas linguistas anglo-saxãs começaram a questionar já na década de 70 a questão de como a linguagem não só reflete mas também constitui as relações sociais", explicou ela.
Ou como afirma a própria Laerte: "Pela via do tratamento e da gramática, rola um grande desrespeito às pessoas trans. Veja, por exemplo, o caso da nova cédula de identidade: de forma inédita, agora o documento informa — na verdade, impõe — o 'sexo' da pessoa. Nesse gesto, amalgama sexo e gênero, só falta definir qual a orientação sexual. É um abuso: o Estado não tem nada a ver com essa questão. Digo isso porque os documentos que somos obrigadas a portar também são uma linguagem."
Laerte, que desconhecia a descrição em áudio, não fez queixas ao serviço de streaming. Ao tomar conhecimento sobre o descuido apontado pela GALILEU, a diretora Eliane Brum informou imediatamente à empresa, que retirou o recurso do ar. "Já foi pedido ao fornecedor uma nova versão corrigida que entrará no ar em breve", informou a Netflix.
Comunicado da Redação – Ariquemes Online
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