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Dom Francisco Xavier Rey: uma experiência educativa contra o analfabetismo no Vale do Guaporé no século XX!

Publicado em: 05/03/2015 - 12:00
Dom Francisco Xavier Rey: uma experiência educativa contra o analfabetismo no Vale do Guaporé no século XX!
Prof. Sílvio M. Nascimento*
 
A formação das professoras para escolarizar o povo ribeirinho nos povoados e distritos do Vale do Guaporé, iniciou-se nos anos 30, após a assunção do religioso franciscano Pierre Elien Rey ou Dom Francisco Xavier Rey, ao comando da Prelazia de Guajará-Mirim. Durante sua chegada, constatou em viagem, o analfabetismo e o abandono do povo nos lugares recônditos por onde passava. Dessa forma, idealizou e fundou o Colégio Santa Terezinha, uma Instituição escolar/religiosa em forma de internato estruturada com limitados recursos financeiros e com o apoio material do poder público e das camadas médias urbanas da sociedade guajaramirense.
 
A Prelazia ampliou os esforços no sentido de por em prática a ideia de construir pequenas escolas nos povoados às margens do rio Guaporé e instruir parte do povo ribeirinho, além de iniciar um trabalho de formação das professoras, em sua maioria, mulheres negras — corolário da formação populacional historicamente constituída de pessoas oriundas dos quilombos — oferecendo-lhes gratuitamente o acesso aos estudos no Internato. Ali, disponibilizava-se educação integral modelada numa organização curricular com estudos relativos às séries iniciais (1ª a 5ª), além de noções de enfermagem e da catequese sobre o comando da professora Emília Bringel, educadora experiente conhecida como Dona Pretinha.
 
Com a fundação do Instituto Nossa Senhora do Calvário em 1937, esta instituição assumiu as funções do Colégio Santa Terezinha em todas as suas vertentes de ensino. O antigo prédio do Internato cedeu seu espaço para a mudança da prelazia onde atualmente abriga um mosteiro. Mas a influência de Dom Rey e os objetivos planejados para formação de meninas ribeirinhas permaneceram inalterados. A direção passou a ser exercida então, pelas irmãs Calvarianas, grupo missionário composto por duas francesas, Irmã Marta do Calvário e Irmã São Rafael, uma irlandesa, Irmã Marta de Jesus e duas freiras brasileiras, Maria Agostinho e Maria Antonieta, esta última falecida após quatro meses de trabalho em Guajará-Mirim.
 
A Escola de Dom Rey era destinada a preparação das primeiras professoras para atuarem nas comunidades ribeirinhas. Em regime de internato, a formação de meninas negras para o magistério, intensificou-se nas duas décadas seguintes, em concomitância com o movimento de revitalização da Igreja Católica em Guajará-Mirim. Seguiam regras rígidas de convivência coletiva, participavam do processo de aprendizagem da catequese, assim como eram avaliadas em sua atuação estudantil e comportamental, muitas vezes, pelo próprio Dom Rey.
 
Após a conclusão dos estudos, eram encaminhadas para suas comunidades de origem. Estavam aptas para atuarem no aprendizado das primeiras letras das crianças ribeirinhas e se tornariam, por seu turno, uma liderança de maior status social por também exercer a catequese, atuarem como enfermeiras, conselheiras e em alguns casos, juízas de paz.A futura professora era o elo entre o povo e as regras morais e religiosas do catolicismo, apropriadas simultaneamente com os conhecimentos básicos oferecidos pela escola.
 
Em fins de 1937, começou o trabalho das primeiras professoras negras em escolas comunitárias fundadas por Dom Rey, nos povoados de Rolim de Moura, Pedras Negras e Limoeiro. O governo do Mato Grosso em acordo com a prelazia de Guajará-Mirim, que inicialmente remunerava estas professoras, assumiu a responsabilidade da nomeação de Paula Gomes de Oliveira, Antônia Quintão, Eremita Cordeiro, Estela Lemos Madeira e Maria de Jesus Evangelista. Verena Leite Ribeiro trabalhou em Vila Bela da Santíssima Trindade e revolucionou a escola na região com atuação inovadora pra época como o ensino de africanidades e a abolição dos castigos físicos aos alunos, entre outras medidas.
 
Com a criação do Território Federal do Guaporé em 13 de setembro de 1943, o primeiro governador Aluízio Pinheiro Ferreira assumiu as escolas dos povoados e nomeou as professoras formadas nas escolas de Dom Rey para o quadro funcional do novo Território. Vivia-se o auge do Segundo Ciclo da borracha, durante a Segunda Guerra Mundial (1939/1945). Muitas dessas professoras, após anos de atuação e dedicação à causa educativa, provaram do reconhecimento popular.
 
Algumas, ainda em vida, tiveram seus nomes escolhidos para a nomenclatura das escolas construídas em diversos municípios de Rondônia, cuja indicação se devia pelo pioneirismo no magistério. É o caso da Professora Alexandrina Gomes que chegou a ocupar a Secretaria Municipal de Educação em Costa Marques ou Izabel Assunção, falecida em 2014, mas que deixou registrado parte desta história num livro.
 
Definir se havia no projeto de escolarização de Dom Xavier Rey a intencionalidade de uma política de dominação religiosa por meio das ações das professoras negras, torna-se menos importante, diante do quadro de abandono geral das localidades sob a jurisdição do governo do Mato Grosso. O trabalho educacional de Dom Francisco Xavier Rey ficou marcado por todas as comunidades ribeirinhas do Guaporé. Suas professoras desempenharam papel importante na alfabetização, no ensino primário e na vida sociorreligiosa, revertendo parte do quadro adverso encontrado quando de sua chegada à Guajará-Mirim.
 
Com essa experiência bem sucedida de Dom Francisco Xavier Rey, a educação do futuro Estado de Rondônia começava a ampliar oportunidades de acesso para o seu povo, apesar da escolarização amazônica ainda se situar distante do sonho ideal de mudanças, com base no que dizia Paulo Freire “que a educação é uma forma de intervenção no mundo”. O projeto de Dom Francisco Xavier Rey e sua formação de professoras contribuíram para enaltecer a incipiente história da educação de Rondônia, fazendo parte do universo acadêmico no qual as mulheres negras passaram a ocupar um lugar de grande destaque no plano educacional e na esfera política, como sujeitos da história.
 
 
 

*O autor é historiador formado pela UFRN e Mestre em educação ela UNIR. – [email protected] 

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